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Emir Sader critica o poder do dinheiro na política

12 de março de 2015

Em palestra no auditório do Sinpro Minas, nesse sábado (7), o sociólogo e cientista político Emir Sader falou sobre ética, democracia, neoliberalismo e outros temas da conjuntura atual. Diante de uma plateia atenta, Emir Sader criticou o poder do dinheiro na política que, segundo ele, é avassalador.

“O legislativo deveria expressar todos os setores da sociedade. Mas entre a sociedade e a representação está o poder do dinheiro. E quem é que tem dinheiro? Se você é financiado por uma empresa, se não cumpre o que ela quer, não financia mais. O que custa uma campanha já significa que é preciso ter dinheiro. É um negócio escandaloso o processo eleitoral”, disse Emir Sader, defensor do financiamento público de campanha.

De acordo com o sociólogo, o Brasil vive desde 2003 um processo de democratização social e, com a chegada do presidente Lula ao poder, houve um resgate do papel do Estado como indutor do crescimento econômico e o governo passou a priorizar as políticas sociais e a ter uma política externa soberana. “Essas três coisas são os fatores principais pelos quais o país mudou muito e para melhor. Essas questões somente foram possíveis pela política”, afirmou, ao defender a política no sentido do interesse coletivo.

Segundo Emir Sader, as críticas de setores da sociedade e da mídia à Petrobras e ao governo fazem parte, na verdade, de uma campanha contra o Estado brasileiro e a favor do mercado. “A corrupção no HSBC, cem vezes maior que qualquer outra, não entra na parada. Porque o que eles querem provar é que o Estado é o elemento de corrupção, de ineficiência. Por isso tem de destruir a Petrobrás e tudo que é estatal. Eles não podem elogiar o mercado. Olhe a crise de 2008, foi o mercado solto que gerou. Então eles atacam o Estado para favorecer indiretamente o mercado”, destacou.

O cientista político também não poupou críticas aos neoliberais e ao poder do capital financeiro. Segundo ele, o modelo de sociedade na era neoliberal é o do “shopping center”, onde tudo é mercadoria e o que interessa não é o cidadão, o direito, mas sim o consumidor e o poder de compra. “Eles querem, na esfera neoliberal, que tudo se transforme em mercadoria. Tudo que já foi direito em algum momento se transforme em mercadoria. Quer dizer, a educação passa a ser uma mercadoria comprada. A esfera mercantil se contrapõe à esfera pública. Na esfera pública, o fundamental não é o consumidor, é o cidadão”.

O sociólogo também defendeu a democratização da mídia e falou sobre o papel que a imprensa exerce ao retratar o cotidiano do trabalhador. “Socialmente não há uma referência para as pessoas saberem quem é que produz a riqueza material existente aqui. Parece que foram as máquinas ou a genialidade de um empresário. Coisa nenhuma. É o trabalhador. São referências que a imprensa ajuda a fazer desaparecer, e com isso eticamente também se degrada nossa sociedade. A imagem social do trabalhador, da massa popular, não aparece, ou aparece nos programas sensacionalistas de segurança pública. É uma coisa brutal, e o monopólio da ética parece estar com a Rede Globo de Televisão. É um esvaziamento grave”, criticou.

Sobre a conjuntura econômica, o sociólogo criticou as medidas de ajuste fiscal e o aumento da taxa de juros. “Não é fazendo ajuste que se retoma o crescimento econômico”, disse Emir Sader, que defendeu também a taxação de grandes fortunas e o combate à sonegação fiscal para aumentar a capacidade de investimento do governo. De acordo com o Sonegômetro, ferramenta criada pelo Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional, em 2013 foram sonegados R$ 415 bilhões em impostos, e calcula-se que esse valor tenha chegado a R$ 500 bilhões no ano passado.

Confira abaixo alguns trechos da palestra.

Neoliberalismo
O neoliberalismo significa desregulamentação, o capital poder circular onde ele bem entender, poder contratar mão de obra como conseguir. Acontece que, como dizia Marx, o capital não é feito para produzir, é feito para acumular riquezas. Livre de travas, ele não se destinou à indústria para gerar empregos e bens. Ele foi para a especulação financeira. Na era neoliberal, passou a ser hegemônico o capital financeiro, que não produz nenhum emprego e bem. Vive da compra e venda de papéis, do endividamento das pessoas, estados e governos. Por isso é uma economia em estagnação, porque é um setor hegemônico que não impulsiona o crescimento econômico.

Isso significa um poder avassalador do dinheiro. Quer dizer, o próprio sistema político foi penetrado profundamente pela ideia de que hoje o poder fundamental está nas mãos de quem possui dinheiro, dos bancos, do sistema financeiro, da modalidade especulativa. Essa é a concepção predominante no mundo hoje. O capitalismo é forte, o imperialismo é forte, o neoliberalismo é forte não tanto pela tecnologia, pela produção e pelo poder militar, mas principalmente pela concepção de mundo que eles têm, que é na verdade o modo de vida norte-americano, que privilegia o poder do dinheiro, o consumo. Qual o modelo desse tipo de sociedade? É o shopping center. É o lugar onde o que interessa não é o cidadão, o direito, é o consumidor, é o poder de compra. Interessa seletivamente quem possa comprar. Tudo é mercadoria, tudo se vende, tudo tem preço. É o contraponto da praça pública, lugar onde as distintas classes sociais se cruzavam e não precisavam comprar absolutamente nada. O shopping center é o que a antropologia chama de não lugar, o lugar inespecífico. Ao contrário da praça, não tem gastronomia local, artesanato local. Quando a pessoa entra no shopping center ela se desliga da sua cidade, do seu mundo, e está conectada, através das marcas, com o circuito global de consumo. Mas é só para alguns, para uma parte das pessoas.

Tecnologia e desemprego
Fernando Henrique contava aquela história, é o desemprego tecnológico. Tecnologia não manda ninguém embora. Quem manda é o patrão. E por que manda embora? Pode-se produzir uma caneta na metade do tempo. Há três alternativas. Uma delas é vocês todos continuarem empregados e a gente produzir o dobro de canetas. Bonito. Segunda: todo mundo continuar empregado, produzir a mesma quantidade de canetas e reduzir a jornada de trabalho pela metade. Maravilha. Terceiro: produzir a mesma quantidade de caneta e mandar a metade dos trabalhadores embora. Então a tecnologia não manda ninguém embora. São as relações de classe, quem tem o poder e se apropria da tecnologia. Quando se inventou a luz elétrica, qual foi a primeira consequência? Bem-estar na casa das pessoas? Nada. Introdução da jornada noturna de trabalho. Então na verdade é uma expropriação dos direitos das pessoas, para deixá-las fragilizadas. É essa brutalidade que está acontecendo na Europa. Sempre é expropriar direitos das pessoas.

Política
A política no Brasil está sendo vítima de um processo de degradação brutal. Mas antes de falar mal, vou falar bem. O Brasil era muito mais desigual do que é. Nos anos 90, quem se lembra, parece que a gente não sairia mais daquilo. Estávamos endividados com o FMI, tomando cada vez mais dinheiro, pagando cada vez mais juros. Saímos graças à política, à genialidade política do Lula, que construiu uma arquitetura política e conseguiu dar uma virada importante no país. Conseguir que o Brasil deixasse de ter como prioridade o ajuste fiscal e passasse a ter as políticas sociais.

Quer dizer, a característica desse governo é a prioridade das políticas sociais. Não é a ideia da ditadura, primeiro cresce, depois distribui, não é a ideia do neoliberalismo, de que é preciso estabilizar a moeda e como consequência imediata a vida de todos melhora, que é o que FHC prometia e não aconteceu.

Em segundo lugar, a prioridade não é o tratado de livre-comércio com os EUA, que é o que fez o México. A vitória do Lula fez com que se brecasse a Área de Livre Comércio das Américas e se privilegiasse a integração regional. Em terceiro lugar, no neoliberalismo a centralidade é o mercado. O governo atual resgatou o papel do Estado como indutor do crescimento econômico, fortaleceu os bancos públicos, garantiu direitos sociais. Essas três coisas são os fatores principais pelos quais o país mudou muito e para melhor. Essas foram questões que somente foram possíveis pela política.

Olha a Europa como está retrocedendo. Então a América Latina, alguns países entre eles, como o Brasil, conseguir, nesse quadro geral de aumento da miséria, da pobreza, se contrapor a isso e diminuir a desigualdade é uma proeza extraordinária.

Poder do dinheiro
Entre a sociedade e a representação [parlamentar] está o poder do dinheiro. O que custa uma campanha já significa que é preciso ter dinheiro. E quem é que tem dinheiro? Se você é financiado por uma empresa, se não cumpre o que ela quer, não financia mais. Em suma, é um negócio escandaloso o processo eleitoral. É verdade que o poder do dinheiro é avassalador. Multiplicado pelo poder da mídia, produz uma opinião pública fabricada, falsificada. E interessa à própria mídia passar a degradar o parlamento, para degradar a política, no sentido do interesse coletivo.

Democratização da mídia
O Brasil teve avanços sociais fundamentais. Agora, é preciso consolidar os valores, a ideologia, uma hegemonia de concepção que corresponda a esses avanços. Isso está sendo bloqueado pelo monopólio privado dos meios de comunicação, que colocam a sua pauta e fazem a sua influência. Então se não houver quebra dessa hegemonia privada, não vai haver meios de se construir no Brasil uma hegemonia ideológica alternativa.

Petrobras
O sucesso da Petrobras é um problema para a direita. É uma empresa estatal, de enorme sucesso. Então trata-se de um lado de desqualificá-la como empresa estatal. Em segundo lugar, de tentar bloquear aquilo que é o passaporte para o futuro, o pré-sal. Acho que há uma tentativa de aproveitar erros efetivos que houve, do ponto de vista de corrupção e tudo mais, para tentar trazer capitais estrangeiros e bloquear o crescimento da Petrobras.

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