Marcelo JustoLondres – A
desigualdade mundial é tão acentuada que até a Cúpula dos Ricos de
Davos, que começou na quarta-feira, a citou como uma das grandes ameaças
para a economia global. Um informe da organização humanitária Oxfam
difundido segunda-feira ilustrou essa realidade com uma comparação que
revela os extremos do desequilíbrio social em pleno século XXI. Segundo
os cálculos da Oxfam, a metade da população mundial – cerca de 3,5
bilhões de pessoas – ganham, somadas as suas rendas, o mesmo que as 85
pessoas mais ricas do planeta. Esta aparente confluência no diagnóstico
entre uma ONG que luta contra a pobreza global e o Fórum Econômico
Mundial, organizador de Davos, termina com a identificação do problema.Em
uma pesquisa da empresa de consultoria internacional
PricewaterhouseCoopers, publicada quarta-feira, ficava claro que as mil
multinacionais que financiam o Fórum de Davos defendem que a
desregulação e a redução do déficit fiscal são fundamentais para lidar
com os problemas econômicos globais. No caminho oposto, a Oxfam pretende
terminar com os paraísos fiscais, promover um sistema tributário
progressista e salários dignos, todas soluções rechaçadas pelas
multinacionais. A Carta Maior conversou com o chefe de pesquisa da
Oxfam, Ricardo Fuentes-Nieva sobre os desafios de promover uma maior
igualdade em um mundo globalizado.A Oxfam está participando
em Davos e coincidiu com a avaliação do Fórum Econômico Mundial sobre os
perigos colocados pela desigualdade. Mas as coincidências param por aí,
não?Ricardo Fuentes-Nieva: Em nosso informe nos
vimos que em 24 dos 26 países mundiais que têm informações estatísticas
dos últimos 30 anos a desigualdade aumentou. Colocado de outra maneira,
sete de cada dez pessoas do mundo vivem em um lugar mais desigual que há
30 anos. Uma segunda conclusão de nosso informe é que os ricos têm uma
crescente influência nos processos políticos, o que coloca sérios
problemas de legitimidade. Por último, pensamos que não razões para que
essa situação siga sendo assim. É um tema que pode ser corrigido com
políticas públicas concretas.Precisamente, mas o caminho que vocês apontam é o oposto do promovido em Davos.RFN:
Nós acreditamos que deve haver um combate global contra a evasão fiscal
e os paraísos fiscais. O estouro financeiro de 2008 aprofundou a
desigualdade com os programas de austeridade aplicados para solucionar
uma crise que teve sua origem nos mais ricos do mundo e sua especulação
financeira. Os paraísos fiscais foram fundamentais nesta especulação e
constituem uma das chaves do desfinanciamento dos estados porque
distorcem a política governamental. Por um lado, forçam políticas de
redução fiscal para os mais ricos para que não recorram à evasão e à
fuga de capital. Por outro, impedem políticas sociais e econômicas que
reduziriam a desigualdade pela queda da arrecadação fiscal. Desde
a década de 70, a carga tributária diminuiu para os ricos em 29 dos 30
países onde existem dados disponíveis. Esta é uma política impulsionada
pelo crescente poder político dos ricos e pelo desequilíbrio em favor
das corporações na distribuição dos lucros econômicos entre
trabalhadores e o capital. O argumento mais citado em favor de
salários baixos e vantagens tributárias é a competitividade das
empresas em um mundo globalizado. Sem questionar a globalização atual,
não parece haver solução para o problema da desigualdade.RFN:
É um ponto muito importante. Parte desta concentração de renda está
vinculada à globalização que, ao mesmo tempo, teve aspectos positivos
ajudando a que milhões de pessoas saíssem da pobreza. Mas o certo é que o
salário real médio decresceu em muitos países. Não se pode afirmar que
este fenômeno se deva pura e exclusivamente à globalização. É certo que
os avanços tecnológicos que acompanharam a globalização foram enormes e
geraram uma redistribuição econômica para grupos com maior nível de
educação. Mas, ao mesmo tempo, a concentração de renda que temos visto
nos últimos dois anos não pode ser explicada por este fator porque a
globalização é um processo em curso há muito tempo.A América
Latina foi um dos lugares mais desiguais do planeta por muito tempo.
Como avalia a situação da região nos últimos dez anos?RFN:
Acreditamos que ocorreram grandes progressos que demonstram que é
possível melhorar as coisas se existe vontade política. Programas
sociais como o Bolsa Família no Brasil, o Trabalhar na Argentina, o
Chile Solidário, e Oportunidades no México, colocaram a América Latina
na vanguarda de políticas inovadoras de intervenção estatal para lidar
com a desigualdade. Mas é certo que isso não foi suficiente. Os
protestos no Chile ou no Brasil são sinais de que resta muito por fazer.
Ainda assim, a tendência é animadora na América Latina e muito melhor
do que em outras partes do mundo.O que pode ocorrer se não se modificar este panorama de crescente desigualdade global?RFN:
Estamos diante de um perigo de ruptura do contrato social e de
dissolução da ideia de cidadania. Se os governos não refletem a vontade
de grande parte da população, começam a perder legitimidade, dinamismo e
colocam em perigo a democracia, os direitos humanos e outras
conquistas. Neste sentido, para além de se a avaliação que Davos faz da
desigualdade como uma das ameaças da economia mundial é um mero
exercício de relações públicas, creio que não é em interesse das mesmas
empresas de Davos que essa situação se desdobra. Esse desdobre não vai
passar de um ano, mas há um perigo que a sociedade se torne esclerosada
com um impacto concreto econômico e com um risco crescente de explosão
social porque, agora, a desigualdade está afetando ao conjunto da
sociedade de muitos países, incluindo as classes médias, que foram uma
das grandes perdedoras da crise de 2008.
Tradução: Marco Aurélio WeissheimerCréditos da foto: Andy Hall/Oxfam
Fonte: Carta Maior
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