Notícias

ECA: 30 anos de uma jornada em defesa dos direitos de crianças e adolescentes

13 de julho de 2020

Estatuto completa três décadas em um momento que escancara a urgência pela afirmação desses direitos

“É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.” Esse é um dos primeiros artigos da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Há exatos 30 anos nascia o Estatuto da Criança e do Adolescente, o ECA, considerado uma das principais conquistas em direitos humanos em nosso país.

Fruto de uma mobilização intensa durante e após o período de ditadura militar no país, o ECA vem como um importante instrumento para crianças e adolescentes saírem de uma condição de submissão, podendo ser sujeitos de direitos. A assistente social do município de Lagoa Santa, Gilvania Paula, explica que o ECA veio substituir o antigo código de menores, uma legislação muito repressiva e que claramente era direcionada a crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social. “O Estatuto traz uma legislação que deve ser aplicada a qualquer criança e adolescente, independente da sua classe social. E isso foi uma conquista”, afirma.

Entre os avanços que podem ser associados ao Estatuto, está a redução da mortalidade infantil.  De acordo com a Unicef, com base em dados do Ministério da Saúde, a taxa passou de 50 para cada mil crianças nascidas vivas, no final da década de 1990, para 12, em 2015. A criação do Plano Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual Infanto Juvenil, Plano Nacional De Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil, do Sistema Nacional Socioeducativo e a implementação do Conselho Tutelar também são conquistas possíveis graças aos caminhos abertos pelo Estatuto.

Ameaças

Simbolicamente, o ECA, neste trigésimo aniversário, deixa a juventude e passa à fase adulta. Mas assim como na vida real, uma fase ainda carregada de desafios e obstáculos.  “Na prática, vemos que, apesar de ser uma lei bastante vanguardista, inclusive referência em outros países, as crianças e adolescentes mais vulneráveis seguem sendo mais desassistidos, por causa da realidade socioeconômica em que eles estão submetidos”, analisa a assistente social Gilvania.

Quando analisamos a posição do governo de Jair Bolsonaro com relação ao ECA, esses desafios se tornam mais evidentes.
No ano passado, o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), um dos órgãos ativos nas implementações das políticas alinhadas ao ECA, sofreu uma tentativa de esvaziamento, o que em si, já representou uma tentativa de ataque aos direitos das crianças e adolescentes.

Para a presidenta do Sinpro Minas, Valéria Morato, o ECA seguramente segue sendo alvo em um governo que vai contra aos princípios básicos da democracia. “A redução da maioridade penal, cortes orçamentários na educação, dados alarmantes do trabalho infantil e de violência contra crianças e adolescentes em nosso país revelam que precisamos seguir lutando por essas vidas”, afirma.

Os desafios na Educação

Um dos direitos destacados pelo Estatuto, amparado também pela Constituição Federal, é o direito à Educação. “A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho(…)”.

Um dos principais avanços conquistados com o ECA também é a diminuição da taxa de analfabestismo (de acordo com a Unicef, desde a criação do Estatuto até o ano de 2013, o Brasil reduziu em 88,8% a taxa na faixa etária dos 10 aos 18 anos). Mas, infelizmente, o atual governo tem revelado total descaso com essa pauta. Um levantamento realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep) mostra que no primeiro ano do governo Jair Bolsonaro houve estagnação nos indicadores educacionais relacionado a taxas de alfabetização de jovens, alunos em escolas de tempo integral, educação profissional e acesso à universidade.

No ano passado, o Brasil registrou 14,9% dos alunos de escolas de tempo integral, enquanto a meta é chegar a 25%. Em 2015, o percentual de alunos com carga-horária estendida era de 18,7%.

Para Valéria Morato, o retrato do Ministério da Educação neste governo também revela os desafios colocados a todos/as que lutam pelos direitos assegurados no ECA. “Vivemos uma instabilidade no MEC, amparada por um projeto político conservador. A prova disso é que o último ministro indicado, o pastor Milton Ribeiro, já fez afirmações lamentáveis, como “criança deve sentir dor”, defendendo abertamente o uso da violência”, destaca.

Direitos e pandemia

A assistente social Gilvania Paula analisa o quanto a realidade da pandemia escancara as desigualdades sofridas por milhões de crianças e adolescentes. “Há uma discrepância ao acesso à educação, por exemplo, quando muitas famílias precarizadas não têm condições de dar o suporte necessário”, pontua. Gilvania questiona como essas crianças e adolescentes podem ser avaliadas/os da mesma forma, sendo que sua realidade étnica, econômica e social já cria abismos. “Infelizmente, vemos com a pandemia o quanto a Lei ainda não consegue assegurar os mesmos direitos a todos/as”, reflete.

Horizontes

Para a assistente social, vivemos uma onda conservadora que defende a penalização, o porte de armas, mais rigor no cumprimento das penas, na educação dos filhos e inclusive defesa do retorno do castigo físico. “Nesta conjuntura, infelizmente, é uma lei  muito criticada, que se vê sem lugar”, destaca. Mesmo assim, para Gilvania, é importante seguir avançando na discussão e na importância do ECA para que o Estatuto possa cumprir a potência do seu papel.

Para a presidenta do Sinpro Minas, Valéria Morato, a defesa do ECA nesta conjuntura é de extrema importância para fortalecer o projeto de país que acreditamos, apesar de tantos retrocessos. “É preciso celebrar esses trinta anos do ECA e seguir lutando para que ele se faça cada vez mais real na vida de todas as crianças e adolescentes. O retrocesso para elas(es) coloca em risco  o direito ao sonho e a um futuro que não é só deles. É nosso, como povo”, afirma.

Foto: Agência Brasil

COMENTÁRIO

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Categorias

Artigo
Ciência
COVID-19
Cultura
Direitos
Educação
Entrevista
Eventos
Geral
Mundo
Opinião
Política
Programa Extra-Classe
Publicações
Rádio Sinpro Minas
Saúde
Sinpro em Movimento
Trabalho

Regionais

Barbacena
Betim
Cataguases
Coronel Fabriciano
Divinópolis
Governador Valadares
Montes Claros
Paracatu
Patos de Minas
Poços de Caldas
Pouso Alegre
Sete Lagoas
Uberaba
Uberlândia
Varginha