Por Marcos Aurélio Ruy, na CTB nacional
Um seleção de filmes para pensar sobre os efeitos do machismo na vida de todo mundo. A opressão sobre as mulheres porque os homens têm medo do feminino ou sofrem uma crise de identidade num mundo onde as mulheres vão à luta para conquistar o seu lugar de direito, fora do ambiente privado.
É a cultura, no caso o cinema, dando o seu recado em favor da mudança. Porque pensar sobre os problemas reais é a melhor maneira de arregaçar as mangas para transpor barreiras, tirar as pedras do caminho e construir uma nova ordem mundial. Uma ordem de igualdade, respeito e paz.
A sétima arte vem cumprindo essa função social muito bem com obras interessantes. E faz tempo. Aqui uma seleção de alguns filmes recentes. Nestes tempos de falta de governo para combater uma severa pandemia, é essencial olhar para o futuro com as reflexões apresentadas por diversos cineastas de diferentes países.
Por Uma Vida Melhor (2019, Òlòtūré, no original), de Kenneth Gyang, Nigéria
No catálogo da Netflix, “Por Uma Vida Melhor” se baseia na história real da jornalista Tobore Ovuorie, que se infiltrou numa rede de prostituição para investigar o tráfico de mulheres na Nigéria para serem exploradas como escravas sexuais na Europa.
O filme denuncia o faturamento da indústria do tráfico de Mulheres no valor de US$ 150 bilhões anuais e de US$ 99 bilhões somente pela exploração sexual.
A vida dessas mulheres se torna um inferno, já tendo que pagar à cafetina no local onde trabalham. As escolhidas para irem para a Europa, sonham retornar com dinheiro suficiente para mudar de vida, quando se deparam com a pior forma de tratamento que um ser humano pode ter, a escravização.
Na vida real, a jornalista escapou de ser “exportada” e publicou suas reportagens em jornais locais e no exterior. No filme. Só assistindo. Essa obra mostra claramente o que John Lennon e Yoko Ono disseram nos anos 1970: “A mulher é o negro do mudo”. Ainda continua sendo, mesmo com os enormes avanços conquistados.
Trailer de Por Uma Vida Melhor, dublado
Silêncio das Inocentes (2010), de Ique Gazzola, Brasil
Lançado em 2010, o documentário conta a história de Maria da Penha e da lei que leva o seu nome. É um retrato fiel sobre a crueldade da violência doméstica, tão drástica no quinto país do mundo mais violento contra as mulheres. A história de Maria da Penha, por si só, é inspiradora.
Muito necessário neste momento da vida do país onde a cultura do estupro parece ganhar espaço no atual governo movido pelo ódio, pela misoginia e por um conservadorismo destruidor de sonhos e de vidas.
Documentário Silêncio das Inocentes completo
A Vida Invisível (2019), de Karim Aînouz, Brasil
Inspirado no livro “A Vida Invisível de Eurídice Gusmão” (2016), de Martha Batalha, a obra cinematográfica retrata na telona o conservadorismo de uma sociedade forjada sob o patriarcado e o racismo e todas as suas consequências de privação de sonhos, desejos e de mudança de vida da maioria dos brasileiros.
A trama é centrada na relação profundamente amorosa das irmãs Eurídice e Guida, pertencentes a uma família de classe média típica dos anos 1950 com pai autoritário, mãe submissa e as tentativas das duas para ludibriar a vigilância paterna para continuarem sonhando com vidas diferentes das que levam.
Guida engravida e é expulsa de casa pelo pai. Vai à luta para criar seu filho de um modo diferente. Como diz a ex-prostituta Filomena, da maneira como é criado o menino se tornará “um bom homem”. Coisa rara na visão de uma mulher sofrida que acolheu Guida como se fosse a sua própria filha, que nunca teve.
Trailer de A Vida Invisível
Kuessipan (2019), de Myriam Verreault, Canadá
Inspirado no livro homônimo de Naomi Fontaine, este longa foi um dos destaques do My French Film Festival. Narra a trajetória de duas garotas do povo Innu, no Canadá.
Como irmãs as duas enfrentam o preconceito contra os indígenas e o machismo imperante mesmo em seu povo. Juntas resistem e mostram que a luta vale a pena para serem donas de suas vidas. Um filme a ser apreciado sem moderação nenhuma.
Trailer de Kuessipan
Aponta pra Fé ou Todas as Músicas da Minha Vida (2020), de Kalyne Almeida, Brasil
O longa paraibano pôde ser assistido no Seridó Cine 2021. O filme remonta à máxima do Cinema Novo “uma câmera na mão, uma ideia na cabeça”, sem nenhuma nostalgia, no entanto. A influência do movimento dos anos 1960-70 é sentida no plano sequência e na temática popular.
Conta a trajetória da resistência em defesa da comunidade ribeirinha Porto Capim, em João Pessoa, na Paraíba, ameaçada pela especulação imobiliária. A protagonista lidera uma comunidade de mulheres, que comanda a resistência.
Bem dirigido e com uma fotografia impecável, o longa traduz o sentimento de todas as pessoas que creem na necessidade de viver em a harmonia coma natureza. A liderança das mulheres é inconteste.
Teaser de Aponta pra Fé ou Todas as Músicas da Minha Vida
Eu Não Sou Um Homem Fácil (2018), de Eléonore Pourriat, França
A comédia tenta imaginar o mundo dominado pelas mulheres, mas predominando a mesma ideologia do patriarcado. Interessante raciocínio para mostrar que o machismo é uma ideologia forjada para manter o sistema intacto. A opressão masculina como meio de manter a dominação de muitos nas mãos de poucos.
Trailer dublado de Eu Não Sou Um Home Fácil
Felicidade por um Fio (2018), de Haifaa al-Mansour, EUA
Baseada na novela de Trisha R, Thomas, a comédia é interessante por transformar completamente a vida perfeita de uma publicitária muito bem sucedida. Ela se descobre traída pelo marido mais que prefeito e se repagina para enfrentar os homens que não aceitam a sua liderança no trabalho e seguir sua vida de mulher independente e livre.
Trailer dublado de Felicidade por um Fio
Inspire, Expire (2018), de Isold Uggadottir, Islândia
A produção da Netflix, de maneira impressionante, consegue mostrar a frieza dos relacionamentos humanos no país europeu que pensamos distante da crise, do desemprego e da intolerância com refugiados e o sentimento de estar refugiada no próprio país com suas instituições rígidas, opressoras e machistas.
Quando o caminho de duas mulheres se cruzam em meio à dureza enfrentada por ambas em dar uma vida boa aos filhos, sem a presença dos progenitores, a realidade vem à tona. Uma foge da violência e da perseguição a outra batalha para ter trabalho e como sustentar a si e ao filho.
Afinal inspirar e expirar é o que pode nos manter vivos, na Islândia, na Guiné Bissau, nos Estados Unidos ou no Brasil.
Trailer de Inspire, Expire disponível apenas na Netflix
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