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A crise brasileira faz parte da geopolítica, diz Theotonio dos Santos

7 de outubro de 2016

Theotonio dos Santos, professor emérito da Universidade Federal Fluminense (UFF), um dos mais conceituados economistas brasileiros de sua geração, com uma extensa e qualificada obra de trânsito internacional, falou sobre os fundamentos da crise brasileira em palestra no Sinpro Minas. O evento Troca de Ideias fez parte das atividades do projeto Saberes de Outubro, em comemoração ao Dia dos Professores.

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Um dos formuladores da Teoria da Dependência e um dos principais expoentes da Teoria do Sistema Mundo (idealizada pelo sociólogo norte-americano Immanuel Wallerstein em 1970). Theotonio dos Santos conceitua a dependência como sendo uma situação na qual a economia de certos países é condicionada pelo desenvolvimento e pela expansão de outra economia à qual está subordinada. A relação de interdependência entre duas ou mais economias, e entre estas e o comércio internacional, assume a forma de dependência quando alguns países (os dominantes) podem se expandir e serem autossustentáveis, enquanto outros (os dependentes) só podem fazê-lo como um reflexo daquela expansão, o que pode ter um efeito positivo ou negativo sobre seu desenvolvimento imediato.

Em entrevista ao programa Extra-Classe, o professor falou sobre como a crise internacional iniciada nos Estados Unidos em 2008 interferiu no Brasil. “O governo norte-americano interviu fortemente na economia com transferência de recursos para o setor financeiro. A dívida dos EUA no começo da crise em 2008 estava em 8 trilhões de dólares e hoje está em torno de 18 trilhões. Mais que dobrou. Com isso conseguiu mitigar a crise no setor financeiro. Não houve uma quebra generalizada, mas houve uma concentração financeira. O argumento dos economistas norte-americanos era que as empresas não podiam quebrar para não gerar desemprego. Esses setores são fortemente protegidos pelo Estado”, disse.

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Crise brasileira

Segundo ele, há uma crise muito grave, contida pelo Estado através do lançamento de títulos de dívida. Mas que esse poder de intervenção é limitado porque não é possível aumentar mais a taxa de juros. “Em 2014, o Brasil estava crescendo. A política anticiclíca era para o país avançar, mas houve um movimento muito forte contra o governo. E o petróleo, que era uma das forças mais importantes para aumentar os investimentos e educação e saúde, teve uma crise brutal de preço. Uma crise que não foi só econômica, mas fez parte da geopolítica norte-americana”, afirma.

Theotonio citou os golpes na Venezuela, Honduras, Paraguai e Argentina como uma política contraofensiva dos EUA na região. “Na Venezuela, conseguiram eleger a maioria no congresso, mas não suficiente para derrubar o governo. Deram um golpe em Honduras para mostrar que os instrumentos jurídicos podem criar situação de queda do presidente. Depois no Paraguai, com um golpe efetivado em poucas horas, além da Argentina”, lembra. Ele afirma que o Brasil também é vítima dessa ofensiva note-americana contra os países que elegeram governos populares.

Como esse país pode se declarar quebrado?”

“O governos Lula e Dilma não enfrentaram o setor financeiro com medo de criar crises. Acontece que proteger esse setor não é suficiente, pois ele quer sempre mais. Portanto é uma ilusão pensar que vai acomodar politicamente a situação com esse tipo de concessões. O problema maior é que a Dilma tinha conseguido baixar a taxa de juros para 6,5%, isso fazia parte do projeto de crescimento do país. Um país que tinha grande possibilidade de exportação, não só para a China, cujas exportações brasileiras passaram de US$ 50 bilhões para US$150 bilhões, produzindo um superávit primário colossal. Hoje o Brasil tem 370 bilhões de reserva. Com essa reserva, como este país pode se declarar quebrado? Só mesmo com esse domínio que a mídia tem no país”, questiona.

“A crise ficou grave porque o aumento da taxa de juros vai criando uma situação insustentável. Quem paga a taxa de juros dos títulos do governo é o próprio governo. O Banco Central decidiu aumentar a taxa de juros, com a justificativa de barrar uma inflação colossal. Mas, a inflação, mesmo alta, estava dentro da meta. É falso achar que o aumento da taxa de juros segura a inflação. Não é verdade porque aumenta os custos das empresas. Assim a economia paralisa e o setor produtivo e a renda caem. A política que era anticiclica, de desenvolvimento nacional, podia ter seus erros, mas estava na direção correta. Tentam fazer agora uma política oposta. O pagamento dos juros já está em mais de 40% do gasto público”, expôs. Segundo ele, a crise é difícil de ser compreendida, porque muitos não conseguem entender o papel da dívida. “Sempre tentam resolver as sucessivas crises econômicas, aumentando a dívida”.

Projeto mundial de dominação

Para o professor, o impeachment da presidenta Dilma e as ações para impedir que o ex-presidente Lula seja candidato em 2018 estão relacionados com uma crise criada e preparada por uma série de ações também no plano psicossocial com técnicas de disseminar ódio na população. “O caso brasileiro é o mesmo de outros países, inclusive com uso de mobilização de massa e os meios de comunicação para disseminar um ódio irracional na população”, afirma.

Theotonio dos Santos acredita que, no caso do Brasil, todas as ações seguem os objetivos de um projeto mundial de dominação. “Atacaram a Petrobras, que estava se tornando na maior empresa do mundo. Eles contam com o apoio social grande das nossas elites.”, constata.

Ele lembra que nas últimas eleições, mais de 40% da população não foi votar. “Quadro difícil. Talvez se um governo tão desprestigiado como o do Temer for tirado no próximo ano, haverá eleição indireta. Querem criar as condições para eleger os candidatos que personifiquem as forças mais poderosas do sistema”, conclui.

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