A Contee enviou hoje (29) uma carta aos presidentes do Senado Federal, Rodrigo Pacheco, e da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, cobrando providências das duas Casas Legislativas em relação à grave situação da pandemia da Covid-19 no Brasil e à inação do governo federal. Confira:
Carta aos
Presidente do Congresso Nacional e do Senado Federal,
Senador Rodrigo Pacheco e
Presidente da Câmara Federal, Deputado Arthur Lira
Senhores Presidentes,
Com os nossos respeitosos cumprimentos, em nome da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee) — que agrega quase uma centena de entidades sindicais (federações e sindicatos) espalhadas por todas as unidades políticas federadas e que têm o dever constitucional de bem representar mais de 1 milhão de profissionais de educação escolar (Art. 205, V, da Constituição Federal), que se ativam em escolas privadas de nível básico e superior, em sua base territorial —, rogamos a V. Exªs que se dignem a tomar contundentes e imediatas medidas de saneamento político, no âmbito da competência das casas legislativas que presidem, imprescindíveis ao inadiável enfrentamento da pandemia da Covid-19, que se acha na sua fase mais agressiva e totalmente fora de controle, especialmente pela comissiva inação do presidente da República e do Ministério da Saúde, por determinação expressa dele.
Senhores Presidentes, o Brasil agoniza, menos aos olhos de sua maior autoridade política: o presidente da República. Os teratológicos números da Covid-19 não deixam dúvidas, pois que o país ocupa a medonha marca de segundo, no mundo, em número de mortos, atrás apenas dos EUA (que, até 20 de janeiro último, foram vítimas de política de igual jaez, conduzida por Donald Trump). Já são mais de 312 mil óbitos, no total, dos quais 100 mil nos últimos 75 dias. E, o que é pior: em grande parcela em razão da exasperação dos hospitais públicos e privados, que não dispõem de leitos, equipamentos e recursos humanos suficientes para atender à galopante demanda.
A falta de leitos hospitalares adequados (UTI), decorrente de deliberado descaso do poder central, que não demonstra nenhum apreço pelas vidas humanas perdidas e pelas que se encontram em vias de serem perdidas, compele os combatentes e abnegados profissionais da saúde a fazerem a desumana escolha de Sofia — parafraseando o livro com o mesmo título, de William Styron, publicado em 1979 —, ou seja, decidirem quem terá a chance de viver, se receber atendimento médico básico, especialmente oxigênio, e quem terá a morte selada por falta dele.
O total de mortos já contabilizado, segundo dados da OMS, representa nada mais nada menos que 11,14% do total de mortes nos 193 países filiados à Organização das Nações Unidas (ONU), que chega ao estratosférico número de 2,8 milhões.
É bem de ver-se que tal desolador número não guarda nenhuma sintonia com o total de sua população, haja vista a Índia, com 1,3 bilhão de habitantes (o que equivale a seis vezes à população do Brasil), e que também se encontra entre os países com maior número de mortes por Covid-19, registrar 162 mil óbitos, ou 51,92% do total do Brasil. Decorre, isto sim, de escolhas governamentais.
Assim, Senhores Presidentes, parece não restar dúvidas de que o presidente da República não nutre o menor apreço pelas vítimas da Covid-19, por seus familiares e por aqueles em via de terem o mesmo triste destino. Em uma palavra: o senhor presidente da República, por sua conduta, demonstra que de humano só tem a arrogante e intragável figura; e nada mais.
Ainda que, em esforço hercúleo, se lhe reconheça a condição de humano, dotado de algum sentimento, o que em nenhum momento demonstrou, resta patente que, para ele, não possui valor algum o brado de valorização da vida humana, lançado ao mundo pelo poeta inglês John Donne (1572-1631) em suas meditações, assim exarado:
“Nenhum homem é uma ilha, isolado em si mesmo; todos são parte do continente, uma parte de um todo. Se um torrão de terra for levado pelas águas até o mar, a Europa ficará diminuída, como se fosse um promontório, como se fosse o solar de teus amigos ou o teu próprio; a morte de qualquer homem me diminui, porque sou parte do gênero humano. E por isso não perguntes por quem os sinos dobram; eles dobram por ti”.
Como já anotado, Senhores Presidentes, a Covid-19 não ceifou uma vida, que já seria bastante para nos diminuir a todos; nem 300 unidades. Foram mais de 300 milhares, o que, forçosamente, tem de nos envergonhar e enlutar, bem como nos obrigar a agir para que isso seja imediatamente contido, sob pena de, em breve, perdermos a nossa condição de humanos, como há muito o fez o presidente da República.
Como que a parafrasear o cônsul romano Marco Tullius Cícero, em suas famosas catilinárias, que remontam ao ano de 63 a.C., em sua luta contra a conspiração política do senador Lucius Sérgio Catilina, que pretendia golpear a República (“Até quando, ó Catilina, abusarás da nossa paciência?Por quanto tempo ainda há-de zombar de nós essa tua loucura? A que extremos se há de precipitar a tua audácia sem freio?”), todos(as) os(as) cidadãos(ãs) que cultuam a ordem democrática e sobretudo que valorizam cada vida humana, como fizera o poeta John Donne, estão a perguntar, em especial a V. Exªs: até quando Bolsonaro vai abusar do Brasil?; até quando vai desdenhar da dor e do sofrimento de todos, em especial de quem já perdeu entes queridos para a Covid-19?; até quando perdurará a sua política genocida?
À luz da CF, cabem a V. Exªs as respostas imediatas a essas cruciais questões, como se colhe de seus Arts. 49, X, 51, I, 78 e 85; senão, veja-se:
Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional:
X – fiscalizar e controlar, diretamente, ou por qualquer de suas Casas, os atos do Poder Executivo, incluídos os da administração indireta;
Art. 51. Compete privativamente à Câmara dos Deputados:
I – autorizar, por dois terços de seus membros, a instauração de processo contra o Presidente e o Vice-Presidente da República e os Ministros de Estado;
Art. 78. O Presidente e o Vice-Presidente da República tomarão posse em sessão do Congresso Nacional, prestando o compromisso de manter, defender e cumprir a Constituição, observar as leis, promover o bem geral do povo brasileiro, sustentar a união, a integridade e a independência do Brasil.
Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra:
I – a existência da União;
…
III – o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais;
IV – a segurança interna do País;
V – a probidade na administração”.
A recente Carta Aberta firmada por mais de 500 economistas, empresários e banqueiros serve como balizador dessa nossa assertiva.
Na referida Carta, em excertos, asseveram:
“Estamos no limiar de uma fase explosiva da pandemia, e é fundamental que a partir de agora as políticas públicas sejam alicerçadas em dados, informações confiáveis e evidência científica. Não há mais tempo para perder em debates estéreis e notícias falsas. Precisamos nos guiar pelas experiências bem-sucedidas, por ações de baixo custo e alto impacto, por iniciativas que possam reverter de fato a situação sem precedentes que o país vive”.
Para conter o coronavírus, propõem quatro medidas que reputam indispensáveis: “acelerar o ritmo de vacinação; incentivar o uso de máscaras, com distribuição gratuita e orientação educativa; implementar medidas de distanciamento social no âmbito local com coordenação nacional; e criar um mecanismo de coordenação do combate à pandemia em âmbito nacional”.
Destarte, Senhores Presidentes, o Brasil preconizado pela CF espera que V. Exªs não faltem aos seus compromissos constitucionais, solenemente jurados, de zelar e defender enfaticamente a ordem social, adotando todas as medidas necessárias para bem os cumprir, sob pena de ela própria perecer por, repita-se, total inação do presidente da República.
Saliente-se, por ser oportuno e essencial, que as medidas postuladas têm como únicos e bons fundamentos a defesa da vida e do Brasil sadio e democrático, peremptoriamente negados pelo presidente da República, não contendo, portanto, nenhum interesse político partidário e/ou outros motes não revelados.
Brasília, 29 de março de 2021.
Gilson Luiz Reis
Coordenador-geral da Contee
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