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Extra-Classe entrevista Marcio Pochmann

9 de julho de 2009

    O programa de TV do Sinpro Minas, o Extra-Classe, debate próximo domingo (19/07) a entrevista com o economista Marcio Pochmann, presidente do IPEA. O Extra-Classe é exibido todos os domingos, às 8h55, na TV Band.  Leia abaixo a entrevista publicada no Jornal Extra-Classe.

 

 

 

Brasil deve crescer 1,5% neste ano, avalia Marcio Pochmann

 

Nos primeiros três meses deste ano, a economia brasileira patinou por causa da crise financeira global e registrou uma retração de 0,8%, em comparação com o trimestre imediatamente anterior, segundo divulgou em junho o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Mas apesar da crise, o economista e presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), Marcio Pochmann, acredita que o país vai crescer em torno de 1,5% neste ano, em função das medidas tomadas pelo governo federal, como a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), a elevação do salário mínimo e a ampliação do Bolsa Família.

 

“Essas e outras medidas somente foram aplicadas agora, diferentemente de outros momentos em que o Brasil enfrentou a crise, como em 1998 e 1999. Nesses momentos anteriores, o governo aumentava os juros e a carga tributária e não aumentava o salário mínimo. Essas políticas de agora estão permitindo que, apesar do agravamento do desemprego, não tenha havido, pelo menos nas grandes regiões metropolitanas, aumento da pobreza; houve foi uma redução. Isso foi fundamental, mas não é suficiente”, argumenta Pochmann, em entrevista ao programa de TV do Sinpro Minas Extra-Classe.  

O economista esteve em Belo Horizonte, em junho, para participar de um debate sobre desenvolvimento e trabalho e lançar o seu mais recente livro, Qual desenvolvimento? Oportunidades e dificuldades do Brasil Contemporâneo. Durante o evento, o presidente do Sinpro Minas, Gilson Reis, também lançou a obra Sindicalismo: cenários de um novo tempo, da qual é organizador. Confira abaixo a entrevista.

 

Em seu mais recente livro, você diz que o Brasil vive uma profunda crise de projetos de desenvolvimento. Que crise é essa?

 

Essa crise revela a indefinição maior da nação em estabelecer um caminho que possa ser liderado por uma maioria e permita ao país chegar a um patamar superior ao que estamos atualmente. Infelizmente, os últimos 25 anos foram muito difíceis para o país. Vivemos um quadro de regressão econômica e social e, agora, estamos diante de uma possibilidade inédita, construindo uma nova visão de Brasil, que não seja subordinado, mas que lidere um novo projeto de desenvolvimento econômico e social com liberdade e sustentabilidade ambiental.

 

O país está caminhando nesse sentido?

A partir do governo Lula há uma outra perspectiva, diferentemente da anterior, que era sustentada numa visão neoliberal. Nos últimos seis, sete anos, há uma reconciliação com a temática do desenvolvimento. Tivemos uma expansão econômica que foi possível combinar redução da pobreza e melhoria no nível de emprego. Mas estamos longe do ideal, e a crise contamina o Brasil e exige o enfrentamento sob novas bases. Mas isso só será feito se houver uma maioria política com essa visão, como em outros momentos, como na década de 30, que nos permitiu romper com o passado e construir o novo.

 

As centrais sindicais defendem a diminuição da jornada de trabalho das atuais 44 horas semanais para 40 horas semanais, isso sem redu­ção de salários. Você vai além e pro­põe uma jornada semanal de 12 ho­ras. Como isso seria possível?

 

Estamos, cada vez mais, dirigidos pelo trabalho imaterial, por aquele trabalho associado a serviços, não mais à indústria, à agricultura. Esse trabalho imaterial termina sendo desenvolvido não apenas no local de trabalho, mas cada vez mais em casa ou em qualquer lugar, em decorrência do uso dos novos meios de comunicação, como o celular e a internet. Isso faz com que os trabalhadores fiquem conectados com o trabalho 24 horas por dia, dormindo e sonhando com o trabalho, preocupados se vai haver trabalho amanhã e se têm condições de acompanhar as metas de produção e de vendas. Isso faz com que a chamada produtividade imaterial cresça muito e gere novos ricos, sem a riqueza  ser melhor dividida. Com esses ganhos brutais de produtividade imaterial é plenamente possível uma jornada de 12 horas semanais. Agora, evidentemente, para se chegar a essa circunstância é necessário um movimento de luta e pressão social, como ocorreu em outros momentos em que se reduziu a jornada de 16 horas para 8 horas diárias.

 

Isso inclusive incluiria milhões de pessoas que estão à margem do mercado de trabalho?

 

Com certeza. É plenamente possível trabalhar menos, já que estamos gerando muita riqueza, e essa riqueza melhor distribuída daria condições de todos trabalharem e, ao mesmo tempo, combinar cada vez mais a vida [do trabalhador] com a educação. Não há dúvidas de que estamos entrando em uma fase em que as pessoas vão viver cem anos, e não há razão alguma para uma pessoa começar a trabalhar antes dos 25 anos. É plenamente possível começar depois dessa idade, mas isso pressupõe distribuição de renda. No Brasil, infelizmente, somente os filhos dos ricos estudam por mais tempo e começam a trabalhar depois dos 25 anos. Os filhos dos pobres estão condenados a trabalhar muito cedo e, infelizmente, não têm condições de ter um acesso à educação adequada, tampouco a uma educação de qualidade.

 

Você defende uma maior participação do Estado na economia como forma de promover o desenvolvimento econômico. Como deve ser, na prática, essa participação? Pode ser, por exemplo, com a regulação do sistema financeiro?

 

Passa por aí, mas não é somente isso. Estamos falando na refundação do Estado brasileiro. O que temos hoje não serve ao povo porque não consegue prestar os serviços de maneira universal. Ademais, o Estado brasileiro cobra e arrecada tributos dos mais pobres, e não dos ricos. Refundação significaria a reconstituição do fundo público, com um sistema de tributação dos mais ricos, liberando os pobres da tributação, e os serviços de saúde, educação e transporte da melhor qualidade possível. Ao mesmo tempo, precisamos, por meio do Estado, reinventar o mercado, pois o que temos hoje é praticamente apropriado por poucas e grandes corporações transnacionais. As micro e pequenas empresas, as cooperativas, não têm espaço para disputar o chamado mercado brasileiro. E por fim, é necessário que o Estado se reorganize e abra a perspectiva de construção de um novo padrão de cidadania, que vislumbre começar mais tarde no mercado de trabalho e estudar a vida toda, porque essa é a perspectiva aberta na sociedade pós-industrial, em que o conhecimento se torna o principal ativo e o motor do crescimento econômico.

 

Qual é a sua previsão para o cres­ci­mento do país neste ano?

 

Trabalhamos com a hipótese de que o Brasil não deve apresentar recessão em 2009. O que nós tivemos no final de 2008 e início deste ano foi uma recessão concentrada no setor industrial. Os outros, de uma maneira geral, não apresentaram recessão, e há sinais nos últimos meses de uma leve recuperação da produção industrial. Então, é bastante provável que o Brasil, diferentemente de outros países, não tenha recessão, embora o crescimento econômico deva ser pequeno, insuficiente para gerar empregos para todos que ingressam no mercado de trabalho, o que significará, infelizmente, aumento do desemprego e dificuldades para o trabalhador brasileiro.

 

O IPEA está trabalhando com alguma projeção?

 

Temos um departamento que trabalha com previsões e a sua última estimativa é de que o Brasil teria uma expansão ao redor de 1,5%.

 

E qual o papel da educação nesse debate sobre o desenvol­vi­men­to do país?

 

A educação tem o papel central de conectar a sociedade no século 21, de prepará-la para uma educação para a vida e, ao mesmo tempo, criar condições para o enfrentamento da crise de sociabilidade que vivemos atualmente, que nos permita ter uma sociedade superior à que temos hoje.

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