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Faculdade dá até ‘aulão’ para cortar custos

11 de janeiro de 2010

Depois da primeira onda de aquisições de unidades de ensino em Minas Gerais, principalmente superior – que promete novos movimentos neste ano -, os investidores apertam os cintos para buscar lucros. E mudam a cara da gestão do setor, com medidas como fusão de cursos, união de turmas e corte de empregos. Estratégias que dão fôlego às instituições, mas despertam reações dos professores, que reclamam de aumento do trabalho extra-classe, redução dos salários médios por meio da substituições de profissionais mais antigos e queda na qualidade do ensino.

O diretor executivo do Sindicato das Escolas Particulares de Minas Gerais (Sinep), Thiers Teófilo, confirma que há uma mudança cultural na gestão dos estabelecimentos. “Hoje temos poucos donos de escola em Belo Horizonte. As unidades estão passando a grupos de outras cidades e estados, que têm uma cultura diferente”, diz. Mas nega que haja perda na qualidade da educação. “É o contrário. As unidades vendidas geralmente estão em dificuldades financeiras. O grupo que adquire chega capitalizado, compra equipamentos e investe na qualidade”, afirma.

Mas estratégias para corte de custos são confirmadas tanto pelos professores quanto pelo Sinep e pelos donos das escolas. Os principais deles, a Anima Educação, a Associação Educativa do Brasil (Soebras) e a Kroton Educacional, que investiram pesado em aquisições no setor em Minas Gerais.

Uma das estratégias é reduzir a carga horária ao mínimo exigido pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC). Outra, a fusão de cursos oferecidos pelo mesmo grupo em diferentes estabelecimentos adquiridos na mesma cidade. Também está sendo implantado o estudo autônomo, em que, apesar de o aluno se matricular para curso presencial, 20% da carga horária é cumprida à distância. “Essas mudanças são todas autorizadas pelo MEC”, explica o diretor do Sinep.

Na fusão entre gestão e educação, surgiram até mesmo palavras novas, como “ensalamento”. Tradução: união de turmas de cursos e períodos diferentes para fazer uma disciplina comum quando há poucos alunos em cada uma delas. “Só que o professor não consegue trabalhar com a mesma qualidade em realidades tão diferentes”, reclama a mestre e doutora em História Suzana Cristina de Souza Ferreira, que passou pela experiência na instituição em que lecionava. Aqui, novamente, a prática não é ilegal, já que o MEC autoriza turmas de até 60 alunos no ensino superior. “Aulão” que significa também mais trabalho extra-classe, outra fonte de queixas.

 “A educação superior virou mercadoria nas mãos de grupos empresariais preocupados só com o retorno financeiro”, afirma a diretora do Sindicato dos Professores de Minas Gerais (Sinpro) Terezinha Avelar. A entidade defende que negociações de instituições sejam controladas pelo Ministério da Educação.

Entre os donos de escolas, entretanto, o corte de custos é visto como essencial. Os primeiros alvos das compras foram, justamente, unidades em dificuldades financeiras motivadas por má gestão e pela inadimplência que, segundo o Sindicato das Escolas, superou média de 30% em 2008 e em 2009. “Quando incorporamos a Faculdade Promove e a Kennedy, as duas estavam com problemas financeiros que iam de salários atrasados à falta de recursos para investimento. Implantamos uma gestão mais eficiente e investimos pesado na melhoria da qualidade da educação”, afirma o diretor de Marketing da Soebras, Thiago Muniz.

Segundo ele, a redução do custo financeiro não implicou “qualquer prejuízo pedagógico”. E o resultado foi o aumento do número de alunos, cita. “Pegamos a Kennedy com cerca de 400 alunos. Hoje estamos com mais do que o dobro disso. E com uma mensalidade justa. Um curso de administração em Belo Horizonte vai de R$ 150 a R$ 1.200. O nosso custa R$ 800, com a mesma qualidade dos mais caros”, afirma.

Economia em alta abre o apetite por escolaA expectativa de crescimento da economia acima de 5% em 2010, com reflexos no aumento da renda dos trabalhadores, vai aumentar o apetite dos grupos empresariais que focam seus investimentos na área educacional. Grandes negociações, como as vistas nos últimos anos e que transformaram a Anima Educação, a Associação Educativa do Brasil (Soebras) e a Kroton Educacional nos principais compradores do mercado e maiores controladores de unidades de ensino, principalmente superior, em Minas Gerais devem se repetir nos próximos meses.

Quem saiu na frente foi a Soebras, que já entrou em negociação para adquirir a Inforium Faculdade de Tecnologia, com sede em Belo Horizonte, e a Universidade do Vale do Rio Doce (Unincor), com nove unidades em todo o Estado.

A Inforium chegou a ficar sem aulas em 2009, por falta de pagamento de salários. Desde que as duas unidades entraram em negociação, foi estabelecida parceria econômica e pedagógica que possibilitou a volta dos estudantes às salas. “Essa parceria pode ou não terminar na incorporação da Inforium pela Soebras. Nossa maior preocupação é que os 800 alunos que estão lá hoje possam concluir o curso”, afirma Muniz. Outro alvo da Soebras é a Unincor, que passa por intervenção do Ministério Público devido às dificuldades financeiras.

Com caixa de R$ 450 milhões, a Kroton também faz questão de anunciar que se mantém na posição de compradora e que o principal alvo das possíveis aquisições no Estado ainda são instituições de ensino superior. “A estratégia da Kroton é crescer, principalmente por meio de aquisições, e estamos atentos às oportunidades de mercado”, afirma o analista de Relações com Investidores do grupo, que controla a marca Pitágoras, Thiago Ribas.

Fontes do mercado ainda colocam como apostas para 2010 a Universidade Presidente Antônio Carlos (Unipac), a Fundação Mineira de Educação e Cultura (Fumec) e a unidade da Universidade Salgado de Oliveira (Universo) em Belo Horizonte.

O diretor de Marketing da Soebras, Thiago Muniz, reconhece interesse pela Unipac, principalmente pela unidade de Barbacena. Mas nenhuma das mantenedoras confirma a possibilidade de negociação. A Fumec é cobiçada pela tradição adquirida, enquanto a Universo estaria em processo de reestruturação para se adequar a exigências do Ministério da Educação (MEC). 

O apetite dos grupos, principalmente dos que abriram capital na Bolsa de Valores e precisam apresentar resultados ao mercado e aos acionistas, é tanto, que até as unidades cujos donos garantem que não estão a venda nem estarão são constantemente assediadas.

Um exemplo é a Faculdade Cotemig, que surgiu do colégio de mesmo nome, em Belo Horizonte. “Realmente, temos sido procurados e já recebemos ofertas para a compra da Cotemig, mas não tenho interesse em vender a instituição. E aproveito para voltar a afirmar que a Cotemig não está à venda”, disse o dono da faculdade e do colégio, Thiers Teófilo, que também é diretor executivo do Sindicato das Escolas Particulares de Minas Gerais (Sinep).

Na avaliação do analista financeiro Paulo Ângelo Carvalho de Souza, para os grupos educacionais, crescer por meio de aquisições é mais rápido e mais barato. “Existe uma previsão de mercado de que a demanda por ensino vai aumentar acima do crescimento da economia nos próximos anos. Então temos motivos para acreditar que as aquisições devem continuar”, explica.

Os alvos preferenciais dos investidores no setor de educação são instituições com problemas financeiros. Este foi o caso, por exemplo, do Centro Universitário UNI-BH, adquirido no ano passado pela Anima Educacional, quando estava com salários atrasados e dificuldades para honrar compromissos. Situação que hoje enfrenta a Inforium.

Mas salários atrasados, segundo a diretora do Sindicato dos Professores do Estado de Minas Gerais (Sinpro), Terezinha Avelar, também são problemas do Instituto Izabela Hendrix, de Belo Horizonte, e da Unincor. Nas duas instituições, os professores ameaçam começar o ano letivo já em greve se os vencimentos não forem quitados até a data prevista para o início das aulas, em fevereiro.

A concorrência predatória, com instituições que oferecem cursos a preço muito inferior a outras, aliada à inadimplência alta e à má gestão, foram os principais ingredientes que derrubaram instituições tradicionais em Belo Horizonte, como UNA e UNI-BH. Mas, na disputa pelo mercado de educação em Minas Gerais, até mesmo as pequenas unidades ganharam atratividade.

“Grandes grupos com ações em Bolsa de Valores veem nas menores oportunidade de entrar em outro mercado. Com o aumento da renda, as classes C e D também estão tendo acesso ao ensino superior, seja para os filhos ou para os próprios trabalhadores, que sempre tiveram o sonho de fazer um curso. Nesse cenário, as faculdades pequenas ganharam potencial de rentabilidade”, avalia o consultor e professor de Economia Paulo Vieira.

O número de instituições de ensino superior em atividade no Brasil aumentou muito acima do total de alunos matriculados na última década. Enquanto em 1998 o país contava com 973 instituições, entre públicas e privadas, no último balanço divulgado pelo MEC, relativo a 2008, esse número pulou para 2.252, devido, principalmente, à abertura de particulares.

No mesmo período, o numero de alunos matriculados passou de 2.125.958 para 2.985.137. Em Minas Gerais, o número de unidades passou de 123, em 1998, para 308, em 2008.

O número elevado de instituições, segundo o mercado, deve manter o movimento de aquisições não só em 2010, mas nos próximos anos, com o fortalecimento dos grupos econômicos.

A Kroton, grupo mineiro que surgiu da marca Pitágoras, abriu capital na Bolsa de Valores de São Paulo em 2007. A Associação Educativa do Brasil (Soebras), também mineira, surgiu a partir da Sociedade Educativa de Montes Claros (Soemoc).

A Anima Educação é um grupo empresarial de São Paulo que adquiriu inicialmente o controle o Centro Universitário Monte Serrat (Unimonte), em Santos (SP). Em 2004 assumiu o controle do Centro Universitário Una e no ano passado assumiu o controle do Centro Universitário Uni BH, ambos em Belo Horizonte. Fonte: Jornal Hoje em Dia / 10/01/10 

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