Notícias

Há 50 anos a direita tentar impor uma reforma política retrógrada

16 de agosto de 2017

O Relatório da Comissão Especial sobre Reforma Política da Câmara dos Deputados trouxe de volta ideias de décadas atrás, como a “cláusula de barreira”, a “proibição de coligações proporcionais” e o “voto distrital misto”. Introduziu o casuísmo do “distritão”, para tentar salvar nas próximas eleições os parlamentares marcados pelo povo por suas posições atrasadas, golpistas e pelo envolvimento com a corrupção.

Por Haroldo Lima*

A “direita” age assim. Quando pode, apanha nos porões da história as bandeiras mais esfarrapadas e bolorentas, apresenta-as como coisas novas e amarra tudo num casuísmo desavergonhado.

Logo que terminou o regime militar, o povo começou a protestar contra a sobrevivência do “entulho autoritário” da ditadura. O Congresso, sensível na época a anseios democráticos, identificou esse “entulho”, no qual três pontos se destacavam: “a cláusula de barreira de 5%”, a “proibição de coligações proporcionais” e o “voto distrital misto”. Cada um tem sua história.

A “cláusula de barreira de 5%” é originária da legislação alemã. Ingressou na vida política brasileira como a “cláusula de barreira de 10%”, da Constituição de 1967, outorgada pela ditadura; evoluiu para a “cláusula de barreira de 5%”, da Constituição de 1969, da Junta Militar; e foi confirmada, anos depois, pelo Pacote de Abril de 1977, do general Geisel, o mesmo pacote que fechou o Congresso e criou os senadores biônicos. Portanto, neste ano de 2017, a cláusula de barreira completa 50 anos que foi introduzida no Brasil, em texto constitucional. A resistência democrática sempre impediu que ela fosse aplicada nos termos previstos.

A “proibição de coligações proporcionais” também vem da época da ditadura. Na Constituição imposta pelos militares em 1967, oito “princípios” regulamentavam o “Funcionamento dos Partidos”. A “proibição de coligações proporcionais” era o oitavo. Assim, a ditadura ajudou a criar, até com apoio de setores de “esquerda”, essa mentalidade tacanha de combate ao instituto da coligação, que não obriga nenhum partido a se coligar com ninguém e não proíbe nenhum partido de se coligar com outro se ambos estiverem de acordo. Portanto, a “proibição de coligações proporcionais” perambula nos textos legais retrógrados brasileiros há cinquenta anos.

O “voto distrital misto”, da mesma forma, foi introduzido no Brasil na época da ditadura, pelo general Figueiredo, que fez aprovar no Congresso a Emenda Constitucional número 22, de junho de 1982, estabelecendo que “os deputados federais e estaduais serão eleitos pelo sistema distrital misto, majoritário e proporcional”. Por causa de sua origem, esse sistema é chamado de distrital misto alemão e tenta-se emplaca-lo no Brasil, como “distrital misto”, há 35 anos.

Contudo, seu ancestral brasileiro é bem mais antigo, é o “distrital” puro, que vigorou desde o Império até o fim da República Velha, durante 77 anos, servindo com a maior eficiência às oligarquias do país. A Revolução de Trinta o extinguiu e trouxe para o sistema político brasileiro coisas novas e progressistas, como: a Justiça Eleitoral, o voto secreto, o voto feminino, sim, pois as mulheres não podiam votar, e o sistema proporcional de votos para as Casas Legislativas. Como vimos, a ditadura militar quis acabar com o voto proporcional, mas não conseguiu, e hoje ele é alvo preferido da “direita” mais retrógrada da Câmara dos Deputados.

Quando o Congresso Nacional identificou como “entulho autoritário” os três pontos acima referidos, junto com outros, tomou providências e lançou-os no porão da história, em maio de 1985. E é de lá que agora o Relatório da Comissão sobre Reforma Política da Câmara dos Deputados foi apanhá-los.

Por isso, é inteiramente correto dizer que o núcleo do Relatório da Comissão sobre Reforma Política em debate na Câmara agora, em 2017, é o mesmo núcleo do “entulho autoritário” revogado em 1985, há trinta e dois anos!

Mas, convenhamos, não é a primeira vez que a “direita” do Congresso tenta resgatar o “entulho autoritário” da ditadura. Uma Comissão Especial para a Reforma Política, criada no Senado em 1988, também foi remexer no “entulho” e de lá retirou esses mesmos três pontos aqui apontados e os condensou no Relatório Sérgio Machado, de 1988, sim, o Sérgio da “delação” recente.

A recorrente tentativa da “direita” nacional de salvar esses três pontos do “entulho” da ditadura e o empenho da “esquerda’ em sepultá-los mostra a disputa contínua na história do Brasil entre uma corrente autoritária, retrógrada, e outra, democrática, progressista. Disputa que ainda não está resolvida.

Além dos três pontos referidos, o referido Relatório sobre Reforma Política acrescenta um outro, o “distritão”, esse, ao que consta, da lavra do ex-deputado e atual presidiário Eduardo Cunha.

Esse “distritão” é um ardil pelo qual parlamentares, com grandes dificuldades para se reelegerem, pretendem reduzir drasticamente o número de concorrentes nas próximas eleições e, como já são deputados conhecidos do eleitorado, tem suas chances de reeleição artificialmente aumentadas.

É sabido que a atual composição do Congresso é das mais atrasadas e das mais envolvidas com a corrupção. Pela artimanha do “distritão”, facilita-se a continuidade desse contingente politicamente retrógrado, ao tempo em que se dificulta enormemente a renovação de mandatos.

A batalha está em curso, mas, derrotar o “distritão” no plenário da Câmara dos Deputados, talvez seja dos objetivos mais importantes que as forças democráticas teriam que cumprir.

*Haroldo Lima é membro da Comissão Política do Comitê Central do Partido Comunista do Brasil e ex- deputado federal pelo PCdoB/BA.

Fonte: Vermelho

COMENTÁRIO

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Categorias

Artigo
Ciência
COVID-19
Cultura
Direitos
Educação
Entrevista
Eventos
Geral
Mundo
Opinião
Opinião Sinpro Minas
Política
Programa Extra-Classe
Publicações
Rádio Sinpro Minas
Saúde
Sinpro em Movimento
Trabalho

Regionais

Barbacena
Betim
Coronel Fabriciano
Divinópolis
Governador Valadares
Montes Claros
Patos de Minas
Poços de Caldas
Pouso Alegre
Sete Lagoas
Uberaba
Uberlândia
Varginha