A pandemia e, por consequência, o isolamento social trouxeram mudanças radicais na vida de todas as pessoas do planeta. Conviver com os diversos medos, com as variadas formas de perdas e as inúmeras mudanças na vida têm sido há 4 meses a nova rotina, inesperada e indesejada. No mundo da educação, escolas, professores, alunos e suas famílias vivem uma experiência que vai na contramão de toda pedagogia pensada para a formação de qualquer aluno/a. A presidente do Sinpro Minas, Valéria Morato, destaca que o trabalho remoto, inclusive para educação infantil, tem trazido estresse para professores/as, alunos/as e suas famílias que tentam de todas as formas driblar os problemas diários para dar sequência ao ensino possível neste momento. “O Sinpro reconhece o empenho de cada professora/a e vem lutando para garantir seus direitos e acima de tudo a vida. Por isso, defendemos o isolamento social, pois ainda é a única forma de conter a propagação do novo coronavírus”, afirma.
Para a professora da educação infantil em escola privada e pública em Lagoa Santa, Renata Alves, tem sido meses de muita pressão. “Fico o dia todo diante do computador e ligada na internet – email, whats’App, redes sociais. Pressão total, o tempo todo apreensiva. A casa e os afazeres domésticos ficam para quando dá tempo. Não dá para ensinar meus próprios filhos, que acabam estudando sozinhos e dependendo da hora que o nosso único computador estará livre para eles”, conta Renata, ao ressaltar que além dos custos altos que teve com aquisição de uma internert com mais capacidade, teve que “aprender, de um dia para o outro, a gravar e editar vídeos. Expondo minha imagem, sem técnicas ou experiência em informática. E o mais tenso é ficar o dia todo esperando algum tipo de informação ou advertência. Os diretores são cobrados pelas famílias e, assim, cobram de nós, professores. Estamos o tempo todo ligados, nos três turnos, com medo das mensagens, medo da conexão da internet falhar na hora da aula, medo de perder o emprego. Sem falar na redução de salário. É tudo muito novo e até a direção das escolas está apertada para lidar com tudo isso”, diz.
Para a professora Sara Brito, que atua em duas instituições infantis em Belo Horizonte, a realidade foi ainda mais complicada, pois logo no início do isolamento social teve seu celular furtado e precisou comprar outro, mesmo sem condições, para poder filmar suas aulas. “Foi uma correria para não ficar muito atrasada com os vídeos. No início, oscilou entre momentos de não sabermos o que fazer até trabalharmos uma carga horária muito maior do que deveríamos. Houve uma semana em que precisei fazer 26 vídeos, somando as duas escolas. Agora, há um revezamento entre vídeo-aulas, videoconferências e lives. Preciso me organizar bem para lidar com tantas demandas, porque além de planejar as aulas e gravar os vídeos (e isso implica todo o aparato de improvisar suporte, iluminação, espaço), ainda tem o processo de edição e envio. Nem sempre a internet ajuda e os vídeos ficam horas para subir para a plataforma virtual. Também há um outro fator neste processo que é o estar em casa com a família, organizar o uso do espaço, pedir silêncio no momento das gravações, etc”.
Sara também destaca a pressão diária. “Lidar com o trabalho em casa e, ao mesmo tempo, cuidar da família e dos afazeres domésticos. Tudo isso com o fantasma da pandemia que exige outras medidas como se programar bem para sair de casa (e apenas para o necessário), higienizar as compras e não ter nenhum tipo de lazer, inclusive para minha filha de apenas 5 anos. É muita coisa ao mesmo tempo nos pressionando”, afirma, ao acrescentar que sente muita falta de estar perto das crianças e poder compartilhar o processo vivido nas oficinas. “A presença é fundamental na educação infantil. As crianças e nós tivemos que nos adaptar nessa relação com a tela. Elas são muito pequenas e o uso das telas é muito delicado, sendo que muitas ainda nem tinham acesso a esta tecnologia antes da pandemia, exatamente pela idade”.
Alguns pais filmam as reações dos filhos quando assistem aos vídeos e também consigo ver as reações quando estamos ao vivo pelo computador. Faço propostas brincantes envolvendo o movimento e, muitas vezes, toco pandeiro. Vejo desde crianças que ficam paradas em frente à tela até reações de pular, dançar e sair correndo. Uma vez, propus brincar de escondidinho e uma aluna, de três anos, se escondeu em outro cômodo. Fiquei um tempão esperando-a voltar… As reações são inúmeras! Ver o retorno das crianças tem sido uma motivação para continuar, na expectativa de que possamos retornar o quanto antes, desde que com protocolos seguros. Acho que esse momento vai deixar muitas marcas e convites a sermos ainda mais criativos e fazermos como as crianças fazem diariamente: experimentar o mundo”, ressalta .
Mesmo no fundamental 1, a professora Renata Alves também percebe o esforço dos/as alunos/as para participarem das aulas remotas. “A maioria está se dedicando, participa das aulas on-line ou gravadas. Mas quanto ao aprendizado não sabemos se está sendo o suficiente. O retorno é pouco e abstrato. Existem muitas dúvidas neste aprendizado a distancia. A única coisa concreta que tenho para dizer é que a saudade dos alunos é grande e que nada se compara com a aula presencial. Amo dar aula e estou sentindo muita falta deles”, diz.
Apoio das famílias
Se o que as escolas e professores vivem neste momento não tem sido fácil , contar com apoio dos alunos e familiares tem sido fundamental para o bom desempenho do trabalho. É o que defende Sara. “Felizmente, as famílias seguem firmes com o pagamento das mensalidades, mandam mensagens de estímulo, filmam o retorno das crianças e mantém o diálogo direto com a gestão das escolas. Também percebo um grande empenho das escolas onde trabalho com relação à manutenção do quadro de funcionários e no pagamento dos salários da melhor maneira possível”, afirma.
Renata Alves também destaca a importância do apoio aos/às professores/as. “Tenho alguns ótimos retornos. Muitas famílias são compreensivas, mas têm outras que cobram vídeos profissionais ou, nas lives, reclamam dos áudios ou da imagem. A gente, com muita paciência, explica que pode ser problemas na própria conexão deles. Todos precisamos estar unidos para enfrentarmos da melhor forma possível, sem grandes prejuízos para as crianças”, diz.
De Lavras, sul de Minas, o Sinpro recebeu um vídeo e umas fotos de uma homenagem que uma professora do fundamental 1 recebeu de seus alunos no dia de seu aniversário, 15 de julho.
Mayara Mesquita Fagundes conta que no início da noite, após a reunião on-line com outros professores da escola onde trabalha, seu esposo, Fernando, e seu filho, Enzo, de 3 anos, a convidaram para descer na portaria do prédio onde eles iriam pegar seu presente de aniversário. Porém, na portaria, ela encontrou uma grande caixa enfeitada, onde estavam dois bolos de aniversário, bombons, flor, cartões e um balão com seu nome e de seus alunos/as. E quando ela se aproximou da caixa que estava na calçada, surgiu uma carreata na sua rua, com os carros com pisca-alertas ligados e buzinando. Eles estavam parados no fim da rua, apenas a esperando, conforme combinaram com seu esposo. Nas janelas de cada carro, seus alunos/as mandavam beijos, faziam coração com as mãozinhas e diziam palavras de carinho. Foram até o final da rua e voltaram da mesma forma.
“Foi tudo tão surpreendente, maravilhoso e emocionante que eu não conseguia parar de chorar. Muito gratificante este reconhecimento das famílias, não tenho nem palavras para descrever minha enorme emoção. É esse reconhecimento e carinho que recebemos das crianças que nos fortalece, nos revigora e mostra que estamos no caminho certo para seguir em frente com esse dom e missão maravilhosa de ser professor/a! Temos nos empenhado arduamente por horas, todos os dias, e ver que os pais dos/as alunos/as têm empatia e reconhecem o nosso esforço diário, diante dessa pandemia, é um presente. Ver o reconhecimento do seu trabalho não tem preço, nada paga o carinho das crianças e de suas famílias. Esta foi uma linda homenagem que eu recebi em meu aniversário, mas a estendo a todos/as os/as colegas de profissão. Só nós sabemos dos enormes desafios, desgastes emocionais e dificuldades em conciliar a nossa família e ensino remoto, pois a sala de aula tem sido a nossa casa. Amo meus alunos/as e sonho com o dia em que poderei abraçar a cada um/a novamente, sem medo de qualquer contaminação”.
Entidade filiada ao
O Sinpro Minas mantém um plantão de diretores/funcionários para prestar esclarecimentos ao professores sobre os seus direitos, orientá-los e receber denúncias de más condições de trabalho e de descumprimento da legislação trabalhista ou de Convenção Coletiva de Trabalho (CCT).
O plantāo funciona de segunda a sexta-feira, das 8h às 18h.
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