Para a presidenta do Sinpro Minas, o mais importante é a garantia da saúde de toda a comunidade escolar
Um estudo da Universidade de Harvard sobre o impacto da Covid-19 nas crianças acrescentou mais um ingrediente ao polêmico debate sobre o retorno das atividades escolares presenciais. Publicado nessa quarta-feira (19/8), no Journal of Pediatrics, o estudo revelou que as crianças pesquisadas carregavam uma carga viral do novo coronavírus muito mais alta do que se imaginava, maior inclusive do que de adultos internados em estado grave em função da doença.
“A explicação que se tem até agora é que as crianças, principalmente as menores, têm poucos receptores para o vírus, em função do sistema imunológico imaturo delas. Com isso, elas têm menos chances de se infectarem. Agora, caso sejam infectadas, podem não apresentar sintomas, mas podem transmitir”, explica a pneumologista pediátrica e sanitarista Maria das Graças Rodrigues Oliveira, que considera prematuro falar em reabertura das escolas no atual estágio da pandemia no país.
“Acho que há duas questões. A primeira é das crianças adoecerem. Depois, de não terem sintomas, mas levarem a doença para a escola, os colegas, os funcionários, os professores e para a casa. A minha opinião é que não é hora de reabrir. Está cedo para voltar. É preciso verificar o que outros estudos estão apontando”, avalia a pediatra.
Para a presidenta do Sinpro Minas, Valéria Morato, o estudo de Harvard mostra como as decisões que envolvem toda a comunidade escolar precisam ser bem planejadas. “É mais um estudo que aponta como o assunto é delicado e demanda muito cuidado por parte dos gestores públicos. Não é tão simples assim dizer que uma determinada localidade está apta para o retorno às aulas presenciais. Há implicações que precisam ser levadas em consideração, e o funcionamento das escolas coloca inevitavelmente em contato um conjunto muito grande da população”, pondera Valéria Morato.
“Não é por menos que as pesquisas feitas até o momento mostram que a maioria da sociedade ainda não se sente segura para esse retorno. Tanto o nosso levantamento, feito com a categoria, quanto a mais recente pesquisa Datafolha, evidenciam isso. De qualquer forma, é preciso ressaltar que a volta às aulas presenciais precisa ser avalizada pela ciência, pelas autoridades médicas, com segurança para todos, e não por achismos”, defende a presidenta do Sinpro Minas.
De acordo com o levantamento feito pelo Sinpro Minas, 84% dos docentes não concordam com o retorno das aulas presenciais até outubro deste ano, e apenas 16% o consideram apropriado. Para o retorno das aulas presenciais, a necessidade de vacina é o item mais citado (72%) pelos pesquisados – 4.420 professores, de 175 municípios mineiros. Já a mais recente pesquisa Datafolha revelou que 79% dos brasileiros acreditam que a reabertura das escolas no país vai agravar a pandemia do novo coronavírus.
“A questão não é simplesmente ser contra ou a favor do retorno. Queremos é que haja segurança para todos, e isso é a ciência quem vai nos dizer. Sabemos da relevância do ensino presencial, de como ele é insubstituível para o adequado processo de ensino-aprendizagem, e o que defendemos é a preservação da saúde de todos, porque a vida a gente não consegue recuperar depois”, afirma Valéria Morato.
Para o infectologista e professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Unaí Tupinambás, a reabertura das escolas deve ocorrer somente quando a taxa de transmissão estiver controlada. Essa é a principal métrica, segundo ele, para discutir o retorno às aulas presenciais.
“Estamos vendo o que está acontecendo em outros países, como Austrália, Vietnã, Coreia do Sul, que reabriram suas escolas. Esses países perceberam que a taxa controlada é de 1 a 5 casos por dia, por cem mil habitantes, durante algumas semanas. Assim poderíamos abrir, mesmo assim com algumas medidas, como o número reduzido de crianças por sala de aula, distanciamento físico, não misturar crianças no recreio, higienização frequente, redefinição de espaços. Belo Horizonte está hoje com 20 a 25 casos por cem mil habitantes por dia, o que é alto, mas está caindo”, afirma o infectologista, que é membro do comitê de enfrentamento à pandemia montado pela prefeitura da capital.
Segundo ele, é preciso construir um consenso com a população em torno desse assunto. “Todo mundo precisa estar atento e trabalhar em cooperação. Nunca foi tão importante a sociedade civil se engajar nas informações da ciência. Não sairemos dessa pandemia se não tivermos consenso, a despeito do nosso presidente [Jair Bolsonaro] jogar em cima do dissenso”, afirma o infectologista.
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